RESUMO
A pandemia de Covid-19 deu urgência ao debate sobre o negacionismo científico. Para muitos, ao evidenciar as relações de poder inerentes às práticas científicas, o campo de estudos de ciência e tecnologia teria aberto o caminho para a contestação da ciência moderna que foi explorado por populistas de extrema-direita. Neste artigo, abordamos essa questão a partir dos debates sobre autoridade epistêmica e os usos da ciência durante a “CPI da Covid”. A análise dos enfrentamentos entre depoentes e senadores permite identificar parte do repertório político “bolsonarista” e revela que esse grupo frequentemente se apropria dos signos e códigos próprios da ciência para legitimar suas posições. Observando processos de acúmulo de credibilidade epistêmica e disputas em torno da demarcação das fronteiras da ciência, o artigo argumenta que a pós-verdade no Brasil não avança pela contestação dos limites entre ciência e política, mas pela reificação desta fronteira e por demandas de purificação da prática científica.
PALAVRAS-CHAVE:
Negacionismo; Pós-verdade; Covid-19; Autoridade epistêmica; Controvérsias científicas