Open-access Amazônia em simbiose: marcas de humanidades que enfrentam o Antropoceno

RESUMO

Este texto propõe uma discussão crítica sobre algumas definições do Antropoceno. A partir de abordagens na arqueologia, etnologia, ecologia e no debate indígena, a Amazônia é o centro de reflexão sobre diferentes momentos da história de interação humana com a região. Ao reconhecermos as marcas de uma exploração acelerada e irresponsável, surge a necessidade de particularizar o que vem sendo entendido como marcas da humanidade. São discutidas marcas milenares, também permanentes, de ações humanas que transformaram a Amazônia. No entanto, essas marcas foram produzidas por pessoas que compreenderam relações complexas que promoveram e criaram condições para ampliar a diversidade. Tal sabedoria, que continua no presente, insiste em afirmar que isso não pode ser tarefa só de humanos. Portanto, a pergunta que emerge é: de quais humanos e de quais Antropocenos estamos tratando?

PALAVRAS-CHAVE:
Antropoceno; Diversidade; Amazônia; Simbiose

ABSTRACT

This paper offers a critical discussion on some definitions of the Anthropocene. From approaches in archeology, ethnology, ecology and indigenous debate, Amazonia is the center of reflection on different moments of the history of human interaction with the region. When we recognize the marks of an accelerated and irresponsible exploration, we need to particularize the marks of humanity. We discuss millennial marks, also permanent, of human actions that transformed Amazonia. Meanwhile, these marks are produced by people who understood complex relations that promoted and created conditions to expand the diversity. Such wisdom, which continues in the present, insists on affirming that it cannot be made only by human. Therefore, the question that emerges is: which humans and which Anthropocenes are we dealing with?

KEYWORDS:
Anthropocene; Diversity; Amazonia; Symbiosis

Na virada do último milênio, com o início da discussão sobre a definição do termo Antropoceno, tem início também a busca pelos marcadores geológicos e paisagísticos da “nova época”, tais como o colonialismo (Lewis; Maslin, 2015), a invenção da máquina a vapor (Crutzen; Stoermer, 2000) ou a bomba atômica (Zalasiewicz et al., 2015). Se, em um primeiro momento, o debate esteve protagonizado por geólogos e especialistas em clima, atualmente se transformou numa arena de controvérsias entre acadêmicos e cientistas das mais variadas áreas disciplinares, artistas, escritores, políticos, lideranças de povos tradicionais e ativistas de movimentos socioambientais. As formas diversas de habitar a Terra geram divergências na compreensão das atuais experiências coletivas de transformação, ressurgência, resiliência, crise ou colapso. Este artigo vem somar ao esforço de outras análises precedentes (Danowski; Viveiros de Castro, 2014; Kawa, 2016; De la Cadena, 2018; WinklerPrins; Levis, 2020; Marras; Taddei, 2022) em que a Amazônia emerge como uma região paradigmática para pensarmos a persistência das vidas humanas e não humanas em florestas, savanas, rios, cidades e plantations no Antropoceno.

Quantos mundos cabem no Antropoceno?

O conceito inaugural de Antropoceno, segundo Crutzen e Stoermer (2000), enfatiza o papel central da humanidade como força geológica e cósmica, com efeitos na terra e na atmosfera, que se prolongarão durante milhares de anos. Inicia-se assim uma nova época que exige uma estratégia mundial de gerenciamento dos ecossistemas globais ante os estresses induzidos pela atividade humana. Podemos igualmente considerar nessa direção as chaves analíticas da Grande Aceleração e da Sexta Extinção. A ideia de Grande Aceleração foi construída a partir da detecção, por parte do Programa Internacional Geosfera-Biosfera (IGBP) (Steffen et al., 2004), de um processo de aceleração síncrona com fortes evidências de alteração do funcionamento do sistema Terra, particularmente o clima, que iniciou nos anos 1950 e se prolonga até os dias atuais. Com base em indicadores de tendências socioeconômicas e termodinâmicas, o processo da Grande Aceleração identifica modificações sem precedentes: as taxas de mudanças causadas pela humanidade a nível global nos últimos 80 anos situam o sistema planetário em um novo estado. Por sua vez, a época em que vivemos é também caracterizada como Sexta Extinção (Lovelock; Allaby, 1983), conectando os processos contemporâneos de extinção em massa de espécies animais, vegetais e fúngicas com os cinco grandes eventos de extinção precedentes na história da vida na Terra - a última extinção tendo ocorrido há 66 milhões de anos, durante o Cretáceo, com o desaparecimento dos dinossauros (Brusatte et al., 2015). O Global Assessment Report On Biodiversity and Ecosystem Services (IPBES, 2019) constatou que, de cerca de 8 milhões de espécies presentes nos ecossistemas globais, 1 milhão de espécies de plantas e animais estão atualmente ameaçadas de extinção. Estudos sobre distribuição de biomassa em escala planetária apontam que 96% da biomassa global de mamíferos corresponde a humanos e gado (majoritariamente vacas e porcos), reduzindo a 4% a biomassa dos mamíferos selvagens do planeta (Bar-on et al., 2018).

Outro caminho para a definição das mudanças planetárias foi a seleção de 9 fatores de aceleração de transformações ocorridas nos últimos séculos, denominados “fronteiras planetárias” (Rockström et al., 2009). Essas fronteiras interligadas visam definir as pré-condições do desenvolvimento humano, estabelecendo limiares biofísicos cuja ultrapassagem poderia ter consequências desastrosas a escala global. O objetivo é, portanto, identificar um “espaço seguro de operação” para os seres humanos. Em 2009, Rockström e associados alertavam que a humanidade já havia transgredido 3 das 9 fronteiras: a interferência dos fertilizantes no ciclo do nitrogênio, a perda de biodiversidade e as emissões de CO2, que já estavam muito além dos limites de segurança.

A partir de diversos parâmetros, essas abordagens desenvolvem processos de classificação das marcas dos humanos na atmosfera e nos ecossistemas do planeta, considerando componentes bióticos e abióticos. Algumas levam em consideração inclusive feitos extraterrestres, como as pegadas dos astronautas que pisaram na lua (Zalasiewicz et al., 2014). A pluralidade de visões abriu um panorama de críticas à ideia de Antropoceno. Um dos questionamentos mais agudos se formulou através do conceito de Capitaloceno (Moore, 2014; Haraway, 2015), ao ressaltar a centralidade do capitalismo na atual encruzilhada da vida planetária. O propósito consiste em revelar “um segredo indecente da história do mundo moderno: o segredo de como o capitalismo foi construído sobre a exclusão da maioria de humanos da Humanidade” (Moore, 2016, p.79), através de um processo que atualmente alcança “a exaustão da sua estratégia de Natureza Barata” (ibidem, p.113). De forma análoga, autores propõem o termo Plantationoceno pela sua abrangência ao identificar um sistema que opera na base da escravidão, da redução de biodiversidade e do consumo de carbono, e provoca “o deslocamento rápido e a reformulação de germoplasma, genomas, estacas, e todos os outros nomes e formas de pedaços de organismos e plantas, animais e pessoas desenraizados” (Haraway 2015, p.162). O Plantationoceno aponta o alcance das práticas de destruição de paisagens multiespecíficas através da substituição por propriedades privadas homogêneas. A mercantilização da plantation implanta um modelo escalável (Tsing, 2012b) que perturba os fluxos heterogêneos de simbioses entre corpos vivos. Capitaloceno e Plantationoceno coincidem ao destacar a relação entre capitalismo e articulação de humanos e outros organismos nas dinâmicas de destruição ambiental, confrontando ideologias que privilegiam a centralidade do Homo sapiens (Hoelle; Kawa, 2020).

Na maioria das tentativas de mensurar as interferências humanas no planeta, a perda da sociodiversidade não apareceu como fator relevante. Parece-nos que o interesse e o investimento em trazer o mamute de volta à vida é maior que os esforços para combater a extinção de minorias, a perda de línguas e o esfacelamento de conhecimentos e tecnologias que afetam diretamente os outros indicadores de diversidade. Parece-nos que a tentativa de generalização mundial do fenômeno humano mais uma vez ignora o papel ativo de uma parcela da humanidade. É pertinente homologar um marco temporal global, ou definir uma camada estratigráfica como marca espacial que constitua “a cavilha de ouro” (golden spike) do Antropoceno, diante da diversidade de formas de habitar a terra e de pensar temporalidades? É possível viver numa época geológica e não fazer parte dela? Ou o Antropoceno seria um (vários) sítio(s) arqueológico(s) e seríamos capazes de delimitar os espaços de seus responsáveis e seus vestígios? O que sobrasse disso seriam refúgios holocênicos ou não sítios da ação humana? A resposta mais imediata provavelmente seria: sim, vivemos no Antropoceno, pois as consequências das ações humanas são globais. Dessa maneira, uns causam e outros sofrem o Antropoceno. Nossa proposta é adicionar mais categorias e pensar que existem ações que possam ser classificadas como antiantropocênicas.

Críticas ameríndias ao conceito de Antropoceno marcam divergências frente à ideia de mundo unitário e se distanciam das abordagens ocidentais sobre um conceito globalista de humanidade, que se torna assim uma categoria em disputa. As reflexões de intelectuais indígenas sinalizam outras perspectivas. Zoe Todd (2015), antropóloga Métis no Canadá, atribui ao conceito proposto por Crutzen um efeito gentrificador, que apaga a diversidade de modos de vida humana. Todd alerta para a necessidade de descolonizar o Antropoceno como categoria analítica de matriz eurocêntrica, racista e patriarcal. Frente a uma teleo- logia que envolve de forma homogênea todos os humanos no atual estado do mundo, é necessário recorrer à “imaginação ecológica” indígena (Todd, 2015) e realizar uma virada para outras formas de reciprocidade, relacionalidade e responsabilidade. Respostas construídas localmente a desafios in situ não podem ser elaboradas a partir de uma única matriz ontológica. Por sua vez, Kyle Whyte (2017), filósofo Potawatomi nos Estados Unidos, avalia o Antropoceno como um episódio intensificado do colonialismo histórico, em que os povos indígenas vivem uma experiência de déjà vu que reedita as práticas promovidas pela expansão capitalista. A mudança climática “antropogênica” deve ser abordada a partir de uma perspectiva de parentesco e reciprocidade entre humanos e não humanos. “Para os povos indígenas, ‘a época do Antropoceno’, como um conceito frequentemente invocado para prever o futuro, não apresenta o espectro de mudanças sem precedentes” (Whyte, 2017). Um processo de indigenização do futuro implica uma reflexão sobre as perspectivas dos ancestrais e sobre o desejo de as gerações atuais serem bons ancestrais para as gerações futuras.

A memória narrativa dos povos do Gran Chaco transmite experiências de transformação do mundo através de inundações, incêndios, terremotos, e registra os excessos próprios da violência colonial e do esbulho das terras. A configuração do mundo não deriva exclusivamente da intencionalidade humana: a estrela-cão da mitologia Toba, as árvores-pilares do céu da memória oral Nivacle e Wichi, a serpente-arco-íris das narrativas Toba-Pilagá (Tola et al., 2019) emergem como agentes da transformação e da regeneração da humanidade após as catástrofes. O mundo se configura em um fluxo de metamorfoses sem origem nem fim, em uma temporalidade espiral que exige a reabilitação constante das relações de cuidado e diplomacia entre humanos e não humanos.

No Brasil, Ailton Krenak recusa um conceito unitário de humanidade ao considerar as drásticas desigualdades do mundo. A humanidade desconectada da terra contrasta com “uma camada mais bruta, rústica, orgânica, uma sub-humanidade, uma gente que fica agarrada na terra” (Krenak, 2019, p.10). O discurso do Antropoceno se torna assim um mecanismo de desistência ante outras histórias contadas pelos povos da terra, capazes de “adiar o fim do mundo”. Em sintonia com essa perspectiva, Jera Guarani (2020), liderança Mbya, propõe “tornar-se selvagem”: diante da perigosa situação do planeta Terra, as formas de vida indígena se constituem como alternativa para os próprios juruá, os não indígenas. A partir da experiência de destruição da Mata Atlântica, os Guarani propõem um debate aberto em que a natureza dos cataclismas está conectada com a sua concepção de origem do mundo e sua cosmografia. Ciclos não homogêneos de destruição do mundo atualizam uma “limpeza da terra” e preparam uma nova humanidade “povoada apenas pelos descendentes das divindades, os próprios Mbya, uma vez que os brancos já esgotaram todas as suas chances e enervaram irreversivelmente os Nhanderu” (Pierri, 2013, p.169). Para eles não há, portanto, um “fim da história”, mas uma regeneração da terra e da humanidade que exclui os brancos. Essas perspectivas sintonizam com a crítica xamânica do “povo da mercadoria” levada adiante por Davi Kopenawa: “Na floresta, a ecologia somos nós, os humanos. Mas são também, tanto quanto nós, os xapiri, os animais, as árvores, os rios, os peixes, o céu, a chuva, o vento e o sol! É tudo o que veio à existência na floresta, longe dos brancos; tudo o que ainda não tem cerca” (Kopenawa; Albert, 2015, p.480). A destruição da terra-floresta (urihi) promovida pelos “comedores de terra”, pessoas com o pensamento “cheio de esquecimento” que “só sonham consigo mesmos”, ávidos pelo “ouro canibal”, provocará a dispersão patogênica da fumaça de metal e a subsequente queda do céu - um tema recorrente na mitologia das terras baixas sul-americanas (Nimuendaju, 1987; Viveiros de Castro, 1986).

As marcas do Antropoceno: humano, desumano ou mais-que-humano?

Frequentemente, quando deparamos com comportamentos antissociais cometidos pelas pessoas, definimos isso como algo desumano, algo que nos afasta de nossa condição humana. Ironicamente, quando essas ações são executadas numa escala ampla, com potencial para afetar grupos humanos e a vida planetária de forma geral, identificamos isso como expressão da marca dos humanos na Terra: a partir dessas marcas é construída a ideia de Antropoceno. Na raiz das transformações atuais se situa o regime capitalista, em todas as suas variações - colonização, escravismo, industrialização, neoliberalismo, capitalismo informacional, geoengenharia. Um dos seus efeitos que não hesitaríamos em considerar como desumano é a fome. Segundo as estimativas das Nações Unidas, quase 10% da população mundial passam fome no mundo. Quase 30% sofrem de algum tipo de insegurança alimentar. Milhões de crianças não chegarão à idade adulta devido a essa condição. A Unicef estima que, nos 15 países onde a situação é mais grave, uma criança morre de desnutrição a cada 60 segundos. Do outro lado do regime, os 10% de indivíduos mais ricos concentram 76% da riqueza gerada pela exploração natural e pela força de trabalho de todo o planeta (Chancel et al., 2022). Quando facetas catastróficas como esta são consideradas é frequente a rotulação desse regime como “capitalismo selvagem” (Traverso, 2017).

No entanto, as populações “selvagens” da floresta amazônica se inspiram numa concepção de humanidade que transborda os limites de uma única espécie natural e que sustenta uma ética do cuidado com outras formas de vida. A condição de “humanos verdadeiros”, presente nas cosmologias amazônicas, é extensiva a outros seres da floresta - e disputada com eles -, pois reconhece-se nos animais, plantas, astros, espíritos-mestres, uma perspectiva subjetiva própria sobre os mundos que habitam. Ou seja, “o referencial comum a todos os seres da natureza não é o homem enquanto espécie, mas a humanidade enquanto condição” (Descola, 1986, p.120). A floresta é, portanto, um espaço interespecífico de sociedades humanas e mais-que-humanas. As ideias de corporalidade e socialidade construídas sobre as bases do parentesco, da consubstancialidade e da economia simbólica da alteridade (Viveiros de Castro, 2002); as relações com os animais fundadas na ética da caça, na dádiva animal e na familiarização (Fausto, 2002); as relações com as plantas inspiradas no cuidado, no parentesco (Maizza, 2014; Morim de Lima, 2017) e na “botânica da precaução” (Aparicio, 2020); e o reconhecimento de múltiplos domínios cosmológicos na constituição das paisagens (Oliveira, 2016) são, todas, componentes que projetam as terras indígenas como os lugares onde a contenção do desmatamento e manutenção da floresta (Calaboni et al., 2021) e a proliferação de biodiversidade alcançam os índices mais elevados (Dawson et al., 2021). As concepções e práticas dos povos indígenas contrastam com os empreendimentos ocidentais de extrativismo de grande escala, que reduzem animais, plantas e minerais à condição de recursos naturais, e visam garantir o crescimento acelerado da economia global.

Estimativas provindas da botânica sugerem que uma porção de 1 hectare de floresta ombrófila densa na Amazônia pode conter mais de 4.700 árvores com diâmetro maior que 10 cm (Condé; Tonini, 2013). Dados publicados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe, 2022) estimam que, em 2022, só a Amazônia Legal Brasileira perdeu 11.568 km2 de floresta. Isso significa que algo como 5 bilhões de árvores foram mortas e, a maior parte delas, simplesmente queimadas sem qualquer aproveitamento. Essa é uma ação a partir da qual, sem dúvidas, podemos identificar marcas permanentes no planeta. O paradoxo é que são precisamente ações desumanas as que definem a configuração de uma nova época no planeta, proposta a partir das marcas da humanidade. Se, por um lado, a visão convencional destacava a excepcionalidade da nossa espécie a partir da sua racionalidade; por outro, devem ser considerados dramas como a desigualdade global ou a supressão das florestas: estaríamos então imprimindo marcas de irracionalidade. Se não houver mudança de perspectiva, anteciparemos o fim da passagem do Homo sapiens pelo planeta. Antes disso, condenaremos à extinção inúmeras outras espécies de maneira muito mais acelerada que qualquer outro processo natural de seleção já registrado. Essas marcas seriam humanas ou desumanas? O Antropoceno é a humanização (“antropização”) excessiva do planeta ou o efeito de uma desumanização superlativa (uma sorte de “Desantropoceno”)? Para os ameríndios, a quebra da socialidade, a falta de moderação com animais e plantas, o comportamento desmesurado, a raiva e a tristeza exacerbadas, o individualismo e a incapacidade de partilha configuram uma condição desumana. É por isso que, nas cosmologias amazônicas, os brancos são concebidos como hiperpredadores, ao lado dos jaguares, as anacondas, os mortos e os espíritos patogênicos.

O paradoxo é que é possível perceber nas sociedades ocidentais contemporâneas uma concomitância entre o crescimento das desigualdades e o avanço do negacionismo climático: ambos os eixos fazem parte de um mesmo e único fenômeno (Latour, 2017). O debate sobre o futuro do planeta carrega consigo uma disputa sobre o conceito de humanidade. Como vimos, os humanos “agarrados na terra” desenvolvem formas de vida entrelaçadas às demais formas de vida presentes nas paisagens, e concebem um mundo divergente do antropocentrismo e do excepcionalismo que caracterizam a concepção de humanidade ocidental. Se é correto afirmar que na modernidade capitalista “a Natureza estava cheia de humanos tratados como Natureza” (Moore, 2016, p.87), também é necessário reconhecer que para os povos indígenas e tradicionais as paisagens estão habitadas por outros humanos e não humanos tratados como sociedades. Em sintonia com as cosmovisões indígenas, novas abordagens propõem uma revisão do conceito de humanidade, superando o antropocentrismo e divergindo de posições pós-modernistas. Nesse sentido, Haraway aborda a relevância das espécies companheiras na constituição da vida humana e, de forma criativa, propõe uma etimologia subversiva segundo a qual “humano” surge do húmus, enfrentando a ideia do Homo autoconstituído e destacando a possibilidade de histórias multiespécies: “Somos húmus, não Homo, não Anthropos; somos compost, não pós-humanos” (Haraway, 2016, p.55), perspectiva que afirma um parentesco vital entre humanos e demais seres vivos. É estreita a sintonia com as cosmologias ameríndias.

De forma próxima, Tsing (2012a) declara que “a natureza humana é uma relação entre espécies”, e destaca como os modelos ocidentais consolidaram os laços entre monocultura e racismo e intensificaram as fronteiras entre as espécies. Em contraste, as populações tradicionais se imergem nas relações com as paisagens através de simbioses entre espécies, condição intrínseca para a proliferação da vida. A autora propõe ainda o conceito de ressurgência - “o trabalho de muitos organismos que, através de diferenças, forjam assembleias de habitabilidade multiespécies em meio a perturbações” (Tsing, 2017, p.52) - e pensa os territórios coabitados pelos povos tradicionais como refúgios holocênicos. Não se trata aqui de definir fronteiras para separar cronologias ou espaços (não seria pertinente apontar uma sorte de primitivismo holocênico dos indígenas frente a um “progresso” antropocênico da modernidade) nem isolar os territórios tradicionais como hotspots de biodiversidade intacta e de harmonia primordial. Os modos indígenas, nesse sentido, coexistem de forma conflitante com as marcas do Antropoceno, mas apontam outras possibilidades de coexistência e coevolução. Poderíamos pensar, por exemplo, nos povos indígenas isolados, que persistem na floresta não como remanescentes arcaicos, mas como populações do século XXI que declaram sua recusa contemporânea (Ribeiro et al., 2022) aos fluxos antropocênicos que os cercam. Ou também abrir os olhos aos chamados povos indígenas “emergentes” ou “ressurgidos” - em realidade “resistentes” (Viveiros de Castro, 2019), que insistem na sua diferença em cenários de homogeneização cidadã, instauração do latifúndio e extinção da biodiversidade.

O que representa o estoque da ação indígena na Amazônia?

As propostas de comunidades tradicionais ao redor do mundo ainda encontram pouco eco fora das ciências humanas, mas mesmo as ciências ocidentais vêm acumulando dados que permitem demonstrar as particularidades locais e regionais para pensar os sítios do Antropoceno. A Amazônia apresenta muitas particularidades locais, e ao mesmo tempo apresenta uma regionalidade continental que a constitui como a maior bacia hidrográfica do planeta. Pensando nisso, abordaremos como algumas pesquisas arqueológicas, etnológicas e botânicas na Amazônia podem nos ajudar a repensar o universalismo do conceito de Antropoceno. Ademais, como será evidenciado, ações humanas na Amazônia possuem temporalidades próprias, por isso, nos parece importante entender que os vestígios dessas ações não são simplesmente reações ao Antropoceno capitalista, mas se enquadram em outras lógicas de interação de humanos ao que é o mundo “natural”. Nesta parte voltaremos o olhar para vestígios relacionados à transformação de relevo (construções), à densidade populacional, aos sistemas políticos conhecidos e à composição da floresta (biodiversidade). O intuito é colocar em evidência ações humanas que apontam dinâmicas antiantropocênicas.

Entre os fatores causadores das mudanças globais, Crutzen e Stoermer (2000) citam um dado de Vitousek et al. (1997) para destacar que 30% a 50% da superfície terrestre foram transformadas pela ação humana. Certamente as partes florestadas do planeta e, especificamente, a Amazônia florestada não entraram na conta das modificações antrópicas. Entretanto, marcas terrestres mais significativas que uma pegada na lua, como os geoglifos da Amazônia (Schaan, 2016), permanecem encobertas por florestas maduras, e locais onde só os impactos indiretos do Antropoceno seriam percebidos. Contudo, um impacto significativo das marcas do Antropoceno na Amazônia, o desmatamento nas últimas décadas, vem justo tornando centenas desses geoglifos visíveis por satélites (outro marco da intervenção planetária moderna) (Figuras 1, 2, 3 e 4).

Os geoglifos foram construídos pelos povos indígenas entre aproximadamente 600 e 2 mil anos AP (Trindade, 2010). Além dessas construções, existem várias outras marcas de intervenções significativas na paisagem do passado da Amazônia (Moraes; Neves, 2012). Um dos principais exemplos de transformação da paisagem foi a formação das Terras Pretas de Índio (TPI) em locais de assentamentos persistentes. As primeiras TPI datam de 6 mil anos (Watling et al., 2018) e variam de 1 a mais de 200 ha de área. Atualmente existem mais de 2000 mil TPI identificadas. Esses locais se tornaram marcadores permanentes da ocupação ameríndia e até hoje são utilizados pelas comunidades tradicionais. Elas integram a arqueoesfera (Edgeworth, 2018) e são alterações de impacto positivo no ambiente.

Estima-se que a história da ocupação humana na Amazônia date de pelo menos 13 mil anos (Roosevelt et al., 1996; Morcote-Rios et al., 2021). Sugere-se também que, por volta da chegada dos primeiros europeus na região, cerca de 10 milhões de pessoas viviam na Amazônia (Denevan, 2014). Mesmo que esses dados gerem estimativas imprecisas, para entender o particularismo das ações humanas é fundamental se perguntar o que se passava em outras partes do mundo na mesma época em que supostamente 10 milhões de pessoas viviam na Amazônia. Quando a Europa estava passando por uma suposta “revolução neolítica” - em realidade, um processo que se prolongou durante aproximadamente 3 mil anos (Graeber; Wengrow, 2021) -, o que estava acontecendo na Amazônia? No ápice da civilização egípcia o que estava acontecendo na Europa? O que estava acontecendo nas florestas africanas quando explodiu a primeira ogiva atômica? O que está acontecendo na parte florestada da Amazônia enquanto escrevemos este texto?

A arqueologia estima que o século XVI não é o ápice populacional na Amazônia (Moraes, 2015; Neves et al., 2021). Em vários lugares os maiores sítios arqueológicos estão datados por volta do ano 1000 AP. No Alto Xingu, por exemplo, Heckenberger (2005) demonstra que os sítios pré-coloniais podem ser até 10 vezes maiores que as grandes aldeias atuais. O que seria então uma “floresta intocada” onde mais de 10 milhões de pessoas viveram há, pelo menos, mil anos? Quantitativo que só volta a ser ultrapassado depois de 1970.1

Figura 1
Mapa com 700 sítios arqueológicos (geoglifos) já conhecidos entre a Bolívia e Brasil.

Figura 2
Recorte de polígono com desmatamento (1260 hectares) que expuseram 11 geoglifos, Lábrea-AM.

Figura 3
Mesmo polígono da Figura 2, no ano de 1985 e com área ainda florestada.

Figura 4
Detalhe aproximado de 4 geoglifos.

As primeiras tentativas de explicar a trajetória da ocupação humana na Amazônia se apegaram a uma ideia de trajetória única da humanidade. Amparados por uma perspectiva de evolucionismo linear, primeiro naturalistas (Martius, 1982) e depois antropólogos e arqueólogos (Steward, 1948; Evans; Meggers, 1968; Meggers, 1971) buscaram verificar em qual estágio da trajetória humana se encontravam os povos americanos. Desenvolvimento, degeneração, dificuldade adaptativa e limitação ambiental foram termos recorrentes nessas sínteses que buscavam comparar esses fenômenos com os feitos das sociedades da região dos Andes, da Mesoamérica, do México e das sociedades ocidentais, entre outras. As conclusões foram que as limitações ambientais e a escassez de recursos não permitiram que os povos amazônicos experimentassem caminhos que levariam a diferenças de classes, urbanismo e formações estatais - justo o caminho ocidental, que desemboca no Antropoceno e no capitalismo.

Já naquele período, um franco debate se constituiu em torno do tema proposto por Pierre Clastres (1974) em “A sociedade contra o Estado”. Essa obra mostrava que as escolhas culturais, e não necessariamente adaptativas, levavam também para diferentes trajetórias de coletivos humanos. Entretanto, nos anos 1980, 1990 e 2000, especialmente na arqueologia, a reação às tentativas de encontrar evidências contrárias ao determinismo ambiental acabaram colocando a pesquisa em uma busca de substituições paisagísticas (desmatamento), agricultura em larga escala e sociedades hierarquizadas que levariam à postulação de sistemas políticos conhecidos como Cacicados Amazônicos (Roosevelt, 1993). As pesquisas permitiram afirmar uma não restrição do ambiente amazônico, mas, mais uma vez, conduziu para uma linearidade evolutiva universal e um “meio caminho amazônico” que pode ser caracterizado como determinismo agrícola (Moraes, 2015). Etnografias contemporâneas têm destacado como a diversidade das práticas indígenas de transformação das paisagens está associada a escolhas políticas que tornam inadequadas as caracterizações dos ameríndios como “nômades”, “sedentários”, agentes de “regressões agrícolas” ou “agricultores” etc. Assim, por exemplo, o modelo de roça de coivara está frequentemente associado a altos índices de mobilidade, o que contradiz a percepção estabilizante que se atribui à agricultura em contextos ocidentais. Igualmente, o surgimento de aldeias com maior adensamento populacional não impede que as pessoas mantenham lugares residenciais alternativos em locais dispersos no território, provocando fluxos constantes de impermanência residencial (Aparicio, 2019). Devido a essa singularidade, Lévi-Strauss (1967) identificou entre os ameríndios um “paradigma antineolítico” contraposto à ideia de uma sequencialidade teleológica entre uma suposta condição caçadora-coletora inicial e uma condição agricultora posterior (Otto, 2018). Não há, portanto, qualquer imperativo de progressão entre o trekking dos caçadores e o cultivo de mandioca: a simultaneidade entre ambos em escalas diversas é possível. Escolhas eventuais pela “perda da agricultura”, ou pela sua incorporação, retomada, alternância etc. são resultado de escolhas políticas (Gow, 2011). Num sentido análogo, Graeber e Wengrow (2021) caracterizam o cultivo indígena na Amazônia como “cultivo lúdico”, que inclui de forma proeminente não tão-somente cultivares de roça, mas também espécies arbóreas (Levis et al., 2018).

Os reflexos de décadas de debates ainda reverberam na atualidade. A velocidade de circulação de dados, aliada à capacidade de processamento dos computadores vêm dando espaço para a criação de modelos preditivos do impacto da ação humana na Amazônia e tentativas de separar o que seriam lugares transformados e com pouca ou nenhuma interferência da ação humana (paisagens prístinas). A questão é que as variáveis utilizadas para essas classificações ainda estão buscando fatores como desmatamento, grandes queimadas e monoculturas como evidências da presença ou ausência dos humanos (Piperno et al., 2015; McMichael et al., 2017).

A atual aproximação entre arqueologia, o debate indígena, a etnologia e a ecologia (Heckenberger et al., 2008; Cabral, 2014; Fausto; Neves, 2018; Jácome; Wai Wai, 2020; Ribeiro et al., 2023) abriu possibilidades para pensar na ação ameríndia, sua inovação e resiliência diante de cenários diversos e, sobretudo, no papel transformador de sua continuidade na longa duração. Num desses esforços recentes de análise em larga escala, desta vez na botânica, Hans ter Steege e mais de uma centena de colaboradores (ter Steege et al., 2013) sugeriram que a diversidade de árvores da Amazônia seria composta por aproximadamente 16 mil espécies. Além deste colossal número para a diversidade, o trabalho também destacou que, apesar da diversidade, 227 espécies são hiperdominantes nas paisagens amazônicas. Especialmente a estimativa das 16 mil espécies foi duramente criticada por outros estudos botânicos. Domingos Cardoso et al. (2017) sugerem a necessidade de uma classificação mais precisa da Amazônia e, entre outras coisas, afirmam que “6.727 árvores, fornecem a melhor contagem atual de espécies de plantas com sementes registradas na floresta amazônica” (tradução nossa). Em 2020 ter Steege et al. (2020) refizeram os cálculos, ajustaram parâmetros e concluíram que, apesar de pequenas variações, os novos resultados são muito próximos dos números apresentados em 2013.

O componente mais destacado desse trabalho para os estudos relacionados com a interação humana e a floresta foi justamente a lista proposta das espé- cies hiperdominantes. Os estudos de 2013 e 2020 destacam a presença de 6 espécies de palmeiras entre as 10 primeiras da lista de 227 espécies.

As mesmas espécies de palmeiras hiperdominantes evidenciadas por ter Steege et al. (2020) aparecem no registro arqueológico desde as evidências mais antigas de ocupações (Morcote-Ríos et al., 2021). Gaspar Morcote-Ríos (Morcote-Ríos et al., 2014, p.39) foi um dos primeiros a questionar qual seria o papel dos humanos para a hiperdominância das plantas amazônicas. Um bom exemplo é o caso do açaí, uma das plantas mais importantes na alimentação amazônica atual e presente na lista de 2013 como a espécie mais abundante da Amazônia. Sementes carbonizadas das ditas palmeiras de polpa (açaí, bacaba, patauá e buriti) aparecem dentre os vestígios de ocupação humana há mais de 9 mil anos no sítio Peña Roja, na Amazônia colombiana (Mora Camargo, 2003; Morcote-Ríos et al., 2014) e na Caverna da Pedra Pintada, há pelo menos 10 mil anos (Shock; Moraes, 2019). À luz desses dados, surge a hipótese de que os, pelo menos, 10 mil anos de relação humana com essas plantas seriam responsáveis pela hiperdominância de espécies amplamente usadas e/ou consumidas.

Sara Coelho et al. (2021) fizeram uma extensa pesquisa sobre a utilidade (alimento, remédio, manufatura, construção e combustível) de árvores e palmeiras na Amazônia e encontraram informações que sugerem que cerca de metade das espécies conhecidas são utilizadas em alguma dessas categorias, destacando que grande parte tem múltiplos usos. Porém, ao comparar os mesmos dados com a dominância das espécies, os números são ainda mais impressionantes: 84% das espécies que dominam a paisagem são listadas como tendo uma ou mais utilidades. De modo geral, espécies com utilidade são 6,4 vezes mais abundantes que aquelas que não apresentam informação de uso. Coelho et al. (2021) concluíram que 207 espécies que aparecem como hiperdominantes nos trabalhos de ter Steege et al. (2013 e 2020) apresentaram informação de uso.

O conceito de lugar significativo (meaningful place), desenvolvido numa arqueologia também mais conectada com a ação indígena na América do Norte (Zedeño; Bowser, 2009), mostra um caminho interessante para pensar o estoque histórico de formação de biodiversidade e para refletirmos sobre os resultados da hiperdominância de espécies na Amazônia. Para elas, lugar (place) é um locus discreto de estilos de comportamento, materiais e memórias. E significativo (meaningful), um produto da interação de pessoas entre si, assim como com o natural e o sobrenatural (ibidem, p.6).

No Rio Madeira, a cachoeira do Teotônio é um lugar interessante para pensarmos no conceito de lugar significativo. Cerca de 9 mil anos atrás as pessoas começaram a acampar em suas margens, provavelmente atraídas pela abundância e facilidade de captura de peixes durante as piracemas. Sendo um dos principais pontos intransponíveis por navegação, um dos primeiros para quem sobe o rio, ou um dos últimos para quem desce, certamente também é um significativo marco simbólico e de localização. Após 3 mil anos de frequentação do local, os retornos parecem ter se intensificado ao ponto de ter se formado uma espessa camada de TPI. A formação da TPI sugere que a partir de 6 mil anos as estadas na cachoeira eram mais demoradas. Além do consumo de peixes, restos orgânicos do processamento de outros alimentos, como mandioca, abóbora e outras plantas cultivadas aparecem no registro. Entretanto, a escolha aparentemente não foi a de transformar o local num campo aberto de cultivo. O que o registro mostra é que a continuidade e o aumento da diversidade na ocorrência de plantas úteis como palmeiras, castanhas, frutas, tubérculos e raízes predominou até as camadas mais recentes das ocupações (Watling et al., 2018).

Na Caverna da Pedra Pintada, em Monte Alegre (PA), os vestígios da presença humana são encontrados desde períodos anteriores a 12 mil anos. Além das evidências da produção de ferramentas líticas, da produção de pigmento, provavelmente associados com as pinturas das paredes do abrigo, restos carbonizados de plantas de diferentes compartimentos da região (savana, floresta e várzea) são abundantes em feições de fogueiras (Roosevelt et al., 1996; Pereira; Moraes, 2019).

Por volta de mil anos atrás aparecem evidências do que devem ter sido as maiores concentrações de pessoas em aldeias (cidades amazônicas?) na Amazônia. Regiões como Santarém (Roosevelt, 1992), o Alto Xingu (Heckenberger, 2005), a Ilha de Marajó (Schaan, 2008), o Baixo Madeira e as proximidades de Manaus (Neves, 2022) conservaram sítios arqueológicos com dezenas - até centenas - de hectares. Vestígios como milho e mandioca estão presentes em vários contextos. Mais uma vez, o que merece destaque é a continuidade da diversidade e a massiva presença de palmeiras, plantas frutíferas e castanhas (Roosevelt, 1980; Shock, 2021). Lugares persistentes como a Caverna da Pedra Pintada continuaram frequentados como parte dessas estratégias de obtenção de recursos.

Pensando no que o Antropoceno representa, esse período de grandes alterações prejudiciais e permanentes, a ideia de que lugares persistentemente ocupados na Amazônia podem ser, e são, locais de maior diversidade de abundância entra em oposição direta com a “desumanidade ocidental”.

O gosto pela biodiversidade é seguramente uma das marcas destacadas nos estilos amazônicos de relação com a paisagem. Os conhecimentos indígenas se projetam de tal forma que as práticas de caça e pesca promovem a proliferação de espécies terrestres e aquáticas. O manejo da paisagem através da sucessão floresta-roça-capoeira-floresta age como dinâmica de aumento da biodiversidade. A aparente desorganização dos cultivos indígenas do ponto de vista agronômico se desenvolve em realidade como um sistema complexo de coevolução de humanos, plantas, aves, roedores, insetos, fungos etc. que incorpora práticas xamânicas, parentesco e ritualidade. Clement et al. (2021) sugerem que, nas terras baixas sul-americanas, 517 espécies de plantas apresentam alguma incipiência de domesticação, 38 são semidomesticadas e 45, domesticadas. É por tudo isso que “no Alto Rio Negro há mais de 100 variedades de mandioca; nos caiapós, 56 variedades de batata-doce; nos canelas, 52 de favas; nos kawaiwetes, 27 de amendoim; nos wajãpis, 17 de algodão; nos baniuas, 78 de pimenta - sem falar na diversidade de espécies em cada roçado e quintal. Para os caiapós, bonito é um roçado com muita diversidade” (Carneiro da Cunha, 2019). Plantas e pessoas promovem circuitos humano-vegetais de troca e reciprocidade, que definem a ênfase diversificante dos sistemas agrícolas indígenas, numa configuração segundo a qual “os povos indígenas são mais do que selecionadores de variedades de uma mesma espécie. Eles são, de fato, colecionadores” (ibidem). Encontramos uma dinâmica diametralmente oposta aos sistemas de commodities baseados na conversão das florestas em plantations, na apropriação privada das terras públicas, na exclusão de populações tradicionais, na redução das paisagens multiespécies, na contaminação por agrotóxicos e na manipulação e controle genético de sementes e matrizes reprodutoras em função das demandas do mercado global.

Podemos reconhecer ainda duas marcas contemporâneas que expressam contrastes nas relações dos humanos com a paisagem amazônica: por um lado, os caminhos, varadouros e trilhas indígenas; por outro, as estradas e rodovias promovidas pelo Estado (no Brasil, de modo mais incisivo a partir da ditadura militar) e o agronegócio. Assim, para os Kaxinawá, humanos, antas e outras espécies colaboram na abertura dos caminhos na floresta. O conhecimento do território é adquirido corporalmente pelos caçadores a partir de percepções olfativas, visuais, sonoras e táteis de presenças animais e vegetais que eles encontram em rotas compartilhadas (McCallum, 2015). Entre os Suruwaha, “caminhos duros” (agi hixa) enlaçam malocas, igarapés, roçados e regiões diversas da floresta, mas as pessoas também reconhecem, através da inalação de tabaco, “caminhos elásticos” (agi duwari) que conectam os humanos com espíritos-cantores (kurimia) e donos dos espíritos das frutas silvestres (agabuji karuji), de modo que seu percurso requer conhecimento e cautela (Aparicio, 2017). Na mesma região, os Banawá reconhecem nos castanhais a cooperação perigosa de humanos e onças na consolidação das trilhas, que são por sua vez perturbadas pelas varas de queixadas e disputadas pelos espíritos-donos das castanheiras (mowe abono) (Aparicio, 2020).

Os Yanomami organizam seu território mediante uma toponímia construí- da sobre lugares significativos conectados por “caminhos-pais” (hwɨɨ e yo pata) e igarapés, e reconhecem fora desse espaço reticular “florestas fechadas” (urihi komi) ocupadas por predadores extra-humanos. Dessa forma promovem um “uso prático da floresta orientada por uma teia de sítios e rotas, ao invés de um conjunto de áreas aproximadamente delimitadas (concêntricas ou não) caracterizadas como zonas de exploração de recursos naturais” (Albert; Le Tourneau, 2007, p.589). Formas análogas de organizar a paisagem a partir da itinerância pelos caminhos, da memória e da experiência de transes xamânicos são também observadas entre os Matsés (Matos, 2017). De modo geral, para os povos amazônicos os caminhos não expressam apenas formas de utilização do espaço, mas materializam experiências de interconexão entre pessoas e eventos (Belik, 2019) junto aos demais coabitantes da floresta.

Se os caminhos e trilhas indígenas são marcas de convivência interespecífica, as estradas e rodovias apresentam uma índole totalmente diferente, pois a sua abertura é o principal vetor de supressão da floresta (Ferrante; Fearnside, 2020). Concebidas como infraestruturas paradigmáticas da integração nacional, estradas e rodovias eliminam biodiversidade e expandem monoculturas vegetais, animais e humanas - é por elas que avançam as “monoculturas da mente” descritas por Vandana Shiva (1993). Associadas ao avanço do desmatamento, as estradas aceleram a atividade madeireira e a conversão da floresta em áreas de produção de soja, milho e pecuária extensiva. Após a tomada de decisões políticas de abertura e consolidação que subestimam os impactos ecossistêmicos, as instituições governamentais não conseguem gerenciar os conflitos socioambientais provocados pelas estradas, que com frequência produzem áreas de baixa governança e elevados índices de violência. A configuração de “espinha de peixe” (Figura 5) típica do processo de abertura das estradas amazônicas produz a proliferação subsequente de estradas e ramais ilegais que ampliam a abrangência dos processos de grilagem e invasão de terras públicas. A diferença dos antigos geoglifos, em que os ameríndios inscreveram no território suas cosmologias através de marcas que conviveram com a paisagem de forma simbiogênica, as estradas e rodovias introduzem perturbações nas formas de vida numa escala que nos permite identificá-las como os novos “geoglifos do Antropoceno”.

Figura 5
Padrão de “espinha-de-peixe”: (1) Rodovia Manaus-Boa Vista (BR-174) e Perimetral Norte (BR-210) em Rorainópolis e São João da Baliza (RR); (2) Transamazônica (BR-230) com a rodovia Cuiabá-Santarém (BR-163) no interflúvio Tapajós-Xingu; (3) Rodovia M. Rondon, Washington Luís e B. Faria Lima (BR-364) entre Pimenta Bueno e Ariquemes (RO). O futuro da “espinha-de-peixe” contrastando, à esquerda, com as TIs Uru-Eu-Wau-Wau e Rio Branco/Massaco e, à direita, TI Igarapé Lourdes, Zoró, Sete de Setembro, Parque do Aripuanã, Nambikwara e Enawenê-Nawê.

Considerações finais

As figuras que ilustram estas páginas expressam contrastes significativos entre os modos de relação com a floresta desenvolvidos pelos ameríndios e pelos agentes coloniais passados e contemporâneos. Os geoglifos construídos e as TPI formadas na Amazônia persistiram durante séculos, no primeiro caso, como construções promovidas por populações indígenas em seus territórios, depois ocultas na vegetação, conservadas até que a supressão da floresta as tornou novamente visíveis. No segundo, o impacto positivo da formação das TPI auxilia na produção agrícola tradicional até os dias atuais. As marcas indígenas na floresta são resultado de formas de coexistência entre os humanos e a paisagem que contrasta com as novas marcas do Antropoceno. Se as aldeias, terreiros, caminhos, roças e demais lugares promovidos pelos povos amazônicos projetam conexões entre espécies, coletivos humanos, formas políticas, línguas, tecnologias e cosmovisões em fluxos de interação constante, as iniciativas ocidentais desenvolvem desconexões entre pessoas, territórios, culturas, e interrompem múltiplos fluxos interespécies.

Tanto a reflexão dos intelectuais indígenas quanto a análise das concepções e práticas ameríndias revelam que os critérios de identificação do Antropoceno estão sendo construídos a partir de parâmetros excepcionalistas e universalistas. A terra-floresta não emerge como um lugar passivo onde incidem os impactos do Antropoceno. As populações amazônicas insistem em produzir estilos de vida criativos que possibilitam a proliferação de simbioses entre humanos e mais que humanos. Se as pesquisas da ecologia histórica nas últimas décadas têm identificado na Amazônia processos de formação das florestas antropogênicas, é pertinente afirmar, em sintonia com as cosmologias regionais, dinâmicas de formação de florestas simbiogênicas. Fazendo valer a sua diferença nos modos de habitar a terra, humanos e mais-que-humanos na Amazônia enfrentam o Antropoceno. A sua familiaridade com a floresta em pé, a sua afirmação de autonomia e resistência política, a diversidade cultural e as concepções que ampliam as fronteiras da socialidade a todos os habitantes da floresta indicam a possibilidade de outras marcas humanas capazes de ativar transformações que vão além do Antropoceno.

Os caminhos da continuidade do presente dependerão de decisões coletivas. Desocidentalizar conceitos e soluções passa também por apontar quais são os sítios arqueológicos da destruição e quais são os lugares da continuidade da vida multiespécie. Uns e outros se afetam reciprocamente, mas, definitivamente, não são as mesmas marcas de humanos.

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Nota

  • 1
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Nov 2024
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2024

Histórico

  • Recebido
    06 Jun 2023
  • Aceito
    17 Abr 2024
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